
O mais revolucionário dos atos é pensar com a própria cabeça. Parece declaração simples, quase óbvia. Mas observe honestamente: quantas das suas decisões importantes foram genuinamente suas versus quantas você tomou porque era o que se esperava de você?
Todos nós vivemos dentro das nossas mentes, em meio aos nossos pensamentos e ideias. Estímulos e experiências passam por filtros condicionados no nosso cérebro. É da natureza humana. Isso gera uma série de efeitos colaterais: crenças limitantes, incapacidade de enxergar os próprios talentos latentes, potenciais adormecidos.
Mas há um efeito colateral ainda mais insidioso: você pode passar a vida inteira remando vigorosamente em um barco que outras pessoas colocaram você, perseguindo objetivos que você internalizou como seus mas que na verdade são expectativas externas que você nunca questionou.
Pense sobre os objetivos principais que você está perseguindo agora. A carreira que construiu ou está construindo. O estilo de vida que mantém. As conquistas que busca. Os marcos que usa para medir sucesso.
De onde vieram esses objetivos? Você os escolheu conscientemente através de reflexão profunda sobre o que realmente importa para você? Ou você simplesmente absorveu o que família, sociedade, cultura corporativa definem como importante?
A família disse que você deveria ser médico, advogado, engenheiro – profissão respeitável, segura. A sociedade diz que sucesso é medido por acúmulo material – casa própria, carro importado, viagens internacionais. A cultura corporativa diz que carreira é prioridade – promoções, títulos, salário crescente.
E você internalizou tudo isso. Não como imposição externa que você resiste, mas como objetivo próprio que você abraçou. Você rema vigorosamente em direção a essas conquistas, acreditando genuinamente que é isso que você quer.
Mas será que é?
Durante aproximadamente cento e cinquenta mil anos de evolução comportamental, os humanos viveram em grupos tribais pequenos onde a conformidade com as expectativas coletivas era criticamente adaptativa. Desviar das normas tribais resultava em ostracismo, que frequentemente significava morte. Não havia sociedade alternativa para ir se fosse expulso do grupo.
Então a seleção natural favoreceu intensamente os humanos que tinham capacidade profunda de internalizar as expectativas do grupo como se fossem objetivos próprios. Não apenas obedecer externamente enquanto resiste internamente, mas genuinamente adotar os valores tribais como valores pessoais. Esse mecanismo foi adaptativamente valioso porque eliminava o conflito interno entre o que você quer e o que o grupo espera.
Você herdou essa capacidade. Por isso consegue absorver objetivos externos e senti-los como genuinamente seus. O desconforto que sente ao considerar decepcionar expectativas – dos pais, do cônjuge, do chefe, da sociedade – não é apenas medo de julgamento externo. É ansiedade profunda porque esses objetivos externos foram internalizados a ponto de você experimentá-los como parte da sua identidade.
Mas aqui está o problema: no mundo ancestral, você pertencia a um grupo com expectativas relativamente coerentes. Hoje você simultaneamente pertence a dezenas de grupos com expectativas frequentemente contraditórias. E o mecanismo de internalização continua operando, fazendo você absorver objetivos conflitantes de múltiplas fontes sem nunca parar para questionar se algum deles é realmente seu.
Aqui está o que torna isso particularmente insidioso: você pode ser extraordinariamente eficiente em perseguir objetivos que não são seus. Acordar cedo, trabalhar duro, manter disciplina, perseverar contra obstáculos, sacrificar prazeres imediatos por ganhos futuros.
Todas essas são virtudes genuínas. O problema não é a eficiência. O problema é a direção.
Você pode estar construindo uma carreira corporativa brilhante em área que não te realiza, apenas porque era o caminho que família considerava respeitável. Pode estar acumulando recursos financeiros muito além do necessário, sacrificando décadas de vida presente por segurança futura que nunca se sente suficiente, porque sociedade equipara acúmulo material com sucesso. Pode estar mantendo relacionamentos mortos por inércia porque expectativa social é que relacionamentos devem durar para sempre.
Em todos esses casos, você está remando. Vigorosamente. Com técnica impecável. Mas no barco errado.
E porque você internalizou esses objetivos como seus, você não experimenta isso como estar no barco errado. Você experimenta como estar enfrentando obstáculos naturais no caminho certo. Então você rema mais forte. Com mais determinação. Mais disciplina.
O que só te leva mais rápido na direção errada.
A boa notícia é que você pode desenvolver capacidade de distinguir entre objetivos genuinamente seus versus objetivos que você internalizou de expectativas externas. Mas isso exige algo difícil: reflexão honesta que questiona as próprias motivações.
Primeiro: para cada objetivo principal que você está perseguindo, pergunte de onde ele veio. Não genericamente – especificamente. Você decidiu ser advogado porque realmente quer ou porque pai advogado sempre disse que é profissão respeitável? Você quer casa maior porque realmente precisa de mais espaço ou porque vizinhança onde mora valoriza casas grandes? Você busca promoção porque cargo te realizaria ou porque cultura corporativa equipara título com valor pessoal?
Segundo: imagine cenário contrafactual onde essas expectativas externas não existem. Se você vivesse em ilha deserta com recursos suficientes e sem ninguém para julgar suas escolhas, você ainda perseguiria esses mesmos objetivos? Se resposta honesta é não, então provavelmente não são objetivos genuinamente seus.
Terceiro: observe o que você faz quando ninguém está olhando. Nos momentos de tempo verdadeiramente livre, sem obrigações ou expectativas, para onde sua atenção naturalmente gravita? Essas inclinações espontâneas frequentemente revelam valores autênticos que você suprimiu em favor de objetivos mais “respeitáveis” ou “práticos”.
Quarto: identifique áreas onde você sente resistência persistente. Não a resistência natural de tarefas difíceis que são parte de objetivos genuínos, mas resistência profunda e contínua que nunca desaparece mesmo com disciplina. Essa resistência pode ser sinal de que você está forçando a si mesmo em direção que não ressoa com valores autênticos.
Pensar com a própria cabeça não significa rejeitar automaticamente toda expectativa externa. Significa examinar conscientemente cada expectativa e decidir deliberadamente quais você adota como suas versus quais você rejeita.
Pode ser que depois de reflexão cuidadosa você conclua que sim, quer mesmo construir carreira corporativa, acumular recursos, seguir caminho convencional. Não há nada intrinsecamente errado com objetivos convencionais se são genuinamente escolhidos.
A diferença crítica é entre adotar objetivos conscientemente versus absorver objetivos automaticamente. Entre escolher seu barco versus aceitar o barco que colocaram você.
Mas fazer essa distinção exige coragem considerável. Porque quando você questiona objetivos que internalizou profundamente, você frequentemente descobre que não são seus. E então enfrenta escolha difícil: continuar remando no barco errado com eficiência, ou mudar para barco certo mesmo que isso decepcione expectativas de pessoas importantes.
Aqui está o que você precisa considerar: remar no barco errado tem custo existencial brutal. Não apenas no sentido de desperdiçar tempo e energia em objetivos que não importam. Mas no sentido mais profundo de viver vida que não é sua.
Você pode chegar ao fim tendo alcançado todos os marcos que sociedade define como sucesso – carreira respeitável, acúmulo material significativo, família convencional – e ainda sentir vazio profundo. Porque nenhuma conquista externa preenche quando você está vivendo vida de outra pessoa.
Por conta da nossa bagagem interior – das vivências, da qualidade dos conhecimentos adquiridos e principalmente das crenças que fomentamos – ficamos sempre confinados a um modelo particular de pensamentos, reações e ativações. Ficamos confinados na nossa mente que foi moldada por expectativas externas que nunca questionamos.
Mas aqui está a possibilidade extraordinária que a neuroplasticidade nos oferece: podemos nos reconstruir continuamente. Novas ideias podem modificar ou superpor as antigas. Isso nos abre a possibilidade de nos reinventarmos, criando um novo “eu” mais alinhado com valores autênticos.
Mas primeiro você precisa reconhecer que está no barco errado. E então ter coragem de mudar.
O mais revolucionário dos atos é pensar com a própria cabeça. Não porque é difícil intelectualmente, mas porque é difícil emocionalmente.
Questionar objetivos que você internalizou profundamente gera ansiedade visceral. Decepcionar expectativas de pessoas importantes causa dor real. Reconstruir vida em torno de valores autênticos exige esforço tremendo.
Mas alternativa é continuar remando eficientemente no barco errado. Desperdiçar a única vida que você tem perseguindo objetivos que não são seus. Chegar ao fim tendo sido extraordinariamente bem-sucedido em viver vida de outra pessoa.
Antes de remar mais forte, pergunte: tem certeza de que está no barco certo?
Cuide da sua saúde mental. Porque ninguém fará isso por você.